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sexta-feira, 16 de setembro de 2016

“I”

"I" 

É a identidade na língua inglesa, pronome que revela o homem para si mesmo e para os demais, a forma como o idioma registra a identificação de cada um de nós, mas quando comparamos a forma escrita deste pronome no “Inglês” com os demais pronomes pessoais noutros idiomas ocidentais como o “eu” do Português ou o “Jê” do Francês ou ainda o “Ich” Alemão, percebemos que ele é bem diferente.

Diferente primeiro porque no Inglês a letra romana “I” se pronuncia “ai” diferente da pronuncia "i" comum aos demais idiomas que usam o alfabeto romano, além disto este mesmo "I" e uma sílaba com dois fonemas expressos numa única letra, e enquanto noutros idiomas que se utilizam do alfabeto romano se pronuncia “i” mas quanto a isto houve um famoso linguista dinamarquês que estudou profundamente como se formou a gramática da língua inglesa, seu nome era Jens Otto Jespersen, ele publicou em 1912 um livro contendo um compendio de todos os seus anos de pesquisa, e neste livro denominado "Growth and Struture of the English Languege" ele detalha todo o processo de formação e desenvolvimento do idioma e da escrita inglesa, nesta obra Jespersen afirma que por volta do século 12, no norte da Inglaterra, a população passou a escrever a primeira pessoa do singular abreviando de "Ic", ou "Ik"  para apenas "I" (ai) 

Quando nos aprofundamos neste conhecimento semiótico percebemos que a maioria dos idiomas da Europa Ocidental nasceu a partir de antigos idiomas falados antes mesmo da chegada do Império Romano, e quase todos estas línguas nem escrita tinham, sendo assim, sua ortografia surgiu a partir de uma adaptação, onde o povo dava aos seus fonemas as letras do Latim. Por isto muitas vezes as mesmas consoantes ou vogais do alfabeto romano, podem ter sons diferentes conforme o idioma. Depois quando o império caiu houve uma miscigenação com outros povos que viviam fora das fronteiras de Roma adentraram na Europa, e isto obviamente influenciou na formatação fonética e gramatical daquelas línguas, mas não influenciou na representação semiótica, porque todos permaneceram usando o alfabeto do Latim para a grafia de seus fonemas. Já durante a Idade Media, houve um processo de consolidação destes idiomas para que ganhassem o formato com o que chegaram até nós. 


Na Grã Bretanha foi um pouco diferente, porque o Celtas tinha escrita mas quando os romanos foram embora não foi o idioma deles que prevaleceu, e sim o Inglês que surgiu a partir das tribos germânicas que ocuparam a ilha, e quanto ao Inglês, o mesmo script foi o mesmo dos demais idiomas europeus. Os Celtas era um povo muito desenvolvido e em muitos aspectos eles eram mais desenvolvidos que os próprios romanos, eles tinham um idioma com representação gramatical e o seu alfabeto se chamava "Ogham"; todavia o "Inglês" não nasceu da base linguística dos Celtas, certamente Celtas influenciaram o idioma inglês, mas a gênese desta língua era antigo idioma dos Anglos e dos Saxões, e este nem escrita tinha, e sua representação gramatical surgiu conforme eles adaptaram as letras romanas a sua forma de falar.

Os romanos tomaram a Inglaterra por volta do ano cinquenta antes da era Cristã, apesar de todo avanço e desenvolvimento da sociedade Celta, eles não resistiram ao poderio de Roma. Contudo quando o império Romano ruiu, os Celtas fracassaram quando tentaram restabelecer seu território e sua cultura. A estratégia Celta foi buscar uma aliança com os Anglo-Saxões vindos da Germânia para expulsar os remanescentes de Roma, isto se deu por volta do ano 410, mas este plano fracassou porque os Celtas não contavam com o fato de que os Saxões poderiam não querer ir embora, e foi exatamente o que aconteceu, ao invés de cooperarem para expulsar os remanescentes romanos eles resolveram se estabelecer na região centro sul da ilha, afinal eram as melhores terras. Com os passar dos anos lentamente os Anglo-Saxões foram tomando o território da Grã Bretanha e restaram aos Celtas apenas a região do País de Gales e a Escócia.

Muitos inclusive não entendem porque Gales e Escócia são nações distintas dentro da Grã Bretanha se afinal fazem parte do mesmo povo, mas na verdade eles não são o mesmo povo. Os galeses e os escoceses são remanescentes mais homogêneos dos Celtas, enquanto o restante das áreas da Grã Bretanha foi majoritariamente ocupada por Anglo-Saxões. E ainda há outro detalhe, galeses e escoceses mesmo sendo de origem céltica são etimologicamente diferentes entre si, porque os Celtas de Gales foram miscigenados com os Romanos, mas o Celtas escoceses não, Roma nunca conseguiu tomar a Escócia, houve até um episódio onde os Romanos construíram um muro no norte da Inglaterra para impedir que os Celtas que viviam na Escócia tentassem retomar seu território na Inglaterra.

Sabedores então que os Celtas preservaram sua hegemonia em parte daquela ilha, porque eles não restabeleceram seu idioma quando o império Romano caiu? Justiça seja feita, ainda existem algumas áreas do país de Gales e da Irlanda onde se fala o idioma Gaélico de origem Celta, mas tirando estes casos isolados, o fato é que todos se renderam ao Inglês.

Há quem especule que o idioma Gaélico e sua escrita o Ogham já haviam sido muito descaracterizados, afinal foram quase quinhentos anos de domínio romano, e por isto mesmo nas áreas onde a maioria da população era Celta, prevaleceu o idioma nascido dos Anglo- Saxões, mas há também quem diga que os remanescentes Celtas se renderam a praticidade, e a sonoridade do "Inglês"; pois o Gaélico é um idioma muito complexo, e sua escrita também era muito ligada às antigas tradições religiosas dos Celtas, tradições estas foram deixadas de lado com o advento da chegada do cristianismo na Grã Bretanha, enquanto o "Inglês" foi sendo desenvolvido já dentro de uma tradição cristã pois até mesmo os reis Anglos e os reis Saxões também foram aderindo ao cristianismo com o passar dos anos. De maneira que apesar das várias etnias que chegaram a ilha, e os próprios Celtas que lá já estavam, todos se renderam ao idioma "Inglês"

No final do século dezenove, houve uma iniciativa para criar um idioma universal que funcionaria como elo entre os povos, este idioma não apenas aglutinaria características ocidentais como também características dos idiomas do Oriente como o "Grego", o "Russo", o "Copta" entre outros, assim surgiu o "Esperanto"; mas apensar de uma grande aceitação e até mesmo terem sido lançadas publicações neste idioma, ainda assim ele fracassou no sentido de não ter conquistado a popularidade que lhe permitiria tornar-se  idioma universal, este fracasso se deu porque ele não conseguiu superar a hegemonia do "Inglês". Muitos atribuem este fracasso do "Esperanto" ao fato de que nos últimos séculos nações que falam "Inglês" se sucederam como as mais poderosas no contexto global, e por isto ele se tornou o idioma mais forte, mas na verdade o "Inglês" seduz por suas características, ele consegue ser fluente e simples, quase visceral por vezes, e ao mesmo tempo profundo e complexo, além de sonoro, e não é sem motivo que muitos artistas e compositores mundo a fora, por vezes cantam e compõe em "Inglês". Sendo assim, o Inglês não conquistou apenas os Celtas e os demais povos que ocuparam a Grã Bretanha, na verdade o "Inglês" conquistou o mundo todo.

Muitos outros linguistas acreditam que os celtas não apenas se renderam ao “Inglês” mas participaram ativamente de sua formação, e mesmo na maioria dos territórios da ilha onde eles foram subjulgados pela presença saxônica os celtas teriam sido muito influentes na formação da língua inglesa, não apenas na pronuncia mas também na escrita como também nos próprios conceitos por trás das palavras e das expressões idiomáticas, se eles estivem certos o idioma pode ter origem germânica mas esta miscigenação deu a ele uma configuração bastante distinta.

Neste processo, este idioma nascido dos Anglo-Saxões foi forjado na mistura com os antigos Celtas enquanto sua escrita foi desenhada enquanto os seus fonemas eram adaptados às representações da escrita romana. Foi dentro desta realidade que surgiu esta expressão “I” como representação da primeira pessoa do singular.

Os idiomas de origem germânica tiveram muito trabalho para fazer esta adaptação às letras romanas, porque entre eles existem fonemas únicos que não encontram pares em outras culturas, o "Ch" por exemplo, muito usado no "Alemão" moderno, que tem um som de "ç" lingual, é um fonema que não encontra correlação noutras línguas, vejamos por exemplo que no "Português", idioma este que guarda uma correlação mais forte com a língua mãe, o "Latim", chamamos a capital da Baviera de "Munique" mas nossa forma de escrever não expressa corretamente a pronúncia do nome daquela cidade, que em "Alemão" se escreve "München" mas isto acontece porque este "ch" do "Alemão" é a representação de um fonema peculiar aos povos germânicos.

No "Alemão" a primeira pessoa do singular é "Ich" parecido com o "Ik" "Holandês". Dizia Jespersen que o pronome da primeira pessoa do singular no Inglês arcaico era representado por  "Ic" que seria bem próximo destes os outros idiomas originados a partir de povos germânicos, todavia ele foi abreviado e passou a ser gramaticalmente representado apenas como "I"   Otto Jespersen também afirma que esta abreviação surgida no norte da Inglaterra, foi rapidamente popularizada em toda a ilha e que o fato dele ser sempre escrito na forma maiúscula se deve a uma prática gramatical comum na Idade Média

Jespersen, Otto Growth and Struture of the English Languege, PH.D, LIT.D, Published By B. G. Teubner 1912 P. 233

Desta forma esta letra romana se tornou a representação da primeira pessoa do singular no idioma Inglês todavia quando nos remetemos ao alfabeto romano devemos lembrar que eles usavam também algumas letras para formar os números.  

O mundo se rendeu a simplicidade e a praticidade dos numerais hindu-arábicos, e praticamente todos os povos hoje usam a mesma representação numérica, mas no passado, a maioria dos idiomas antigos, formavam os números a partir de algumas letras, eles conferiam valor numérico às letras, e usavam tais letras para formar seus numerais, existe inclusive uma grande celeuma a este respeito, porque um dos antigos idiomas que fazia desta forma era o "Hebraico" e há quem acredite que nos textos bíblicos dos antigos judeus escritos em “Hebraico”, existe um código numérico secreto registrado na forma de palavras, na medida em que cada letra tinha também um valor numérico. Celeumas a parte os romanos faziam o mesmo, conferiam valores numéricos às suas letras, mas não com todas as letras, eles selecionaram as letras "I", "V", "X", "L", "C" e "M" atribuindo a cada uma delas um valor e desta forma formando seus números, sendo que "I" representa exatamente a unidade.

Pois bem, isto faz com que a mesma letra "I" que no idioma "Inglês" expressa o pronome na primeira pessoa do singular, também pode ser o numeral romano que expressa a unidade, o número “um”.

Este é um fato extraordinário e fascinante pois quando digo "I", posso também estar sinalizando que sou "um" ou que sou "Único". E me pergunto; teria isto sido obra do mero acaso? Ou quem sabe alguns remanescentes Celtas não idealizaram isto propositadamente?  Jespersen afirma que foi no norte da Inglaterra que o pronome pessoal foi abreviado apenas para "I", e sabedores que aquela região foi hegemonicamente Celta tendo menor penetração Anglo-Saxônica, será que aquele povo com sua sabedoria extraordinária envolta em tantos mistérios, não passou propositadamente a representar o "Ic" como apenas "I" para que o individuo expressasse seu "eu" expressando também sua "unidade" ?

Havia na sociedade Celta a figura dos Druidas que eram mestres nas mais diversas ciências, será que ainda existiam tais mestres por volta de do século 12 quando Jespersen afirma que o "I" passou a ser usado? Ou quem sabe ainda houvesse naquela época no norte da Inglaterra algum daqueles antigos que antes mesmo dos Celtas construíram Stonehenge?

Faço estas conjecturas porque é tão extraordinária que a representação gramatical que expressa a unidade seja a mesma usada como pronome da primeira pessoa do singular, que é incômodo pensar que isto possa ter ocorrido ao mero acaso. Mas talvez não tenha sido realmente ao acaso, porque a explicação de Jespersen para o fato do pronome ser sempre representado na forma maiúscula não é lá muito convincente, além disto quando no mesmo “Inglês” se usa o pronome possessivo “meu” no “Inglês” My” eles usam o “Y” e não o “I”, então pode ter sido proposital que esta mesma letra seja primeira pessoa do singular e também a representação numeral romana de unidade.

Infelizmente nunca chegaremos à um veredito nesta questão, e de fato muitos inventos e muitas descobertas da ciência ocorreram ao acaso. Mas ainda assim, quero crer que alguma comunidade durante aquele período de formação e consolidação do idioma "Inglês" propositadamente fez esta abreviação, por julgar fascinante esta grafia, pois vejamos que sendo o "I" também a representação ortográfica da unidade romana, toda vez que conjugo a primeira pessoa do verbo "To Be" o verbo "ser" no "inglês" e afirmo "I am" é como se dissesse "um sou" ou o "um que sou" ou ainda "sou único".

Cada vez que usamos a primeira pessoa do singular, estou remetendo a unidade que represento, o ser único que sou, definitivamente não poderia haver representação melhor.

Mero acaso ou não, pouco importa, "I" é a perfeita representação de que cada um de nós é um ser único. E cada vez que me deparo com a grafia da primeira pessoa no singular no "Inglês" também me deparou com a afirmação que sou único, mas neste momento percebo que nos falta esta consciência, a maioria de nós não se percebe.

Interessante pensar que os Celtas acreditavam numa interação do ser humano com a natureza, e que desta interação surgiria uma interação com o divino, mas o ser humano moderno é totalmente desconectado e destrutivo, destruindo o mundo e a natureza e destruindo a si mesmo, consequentemente sua perspectiva de divindade é tão doente quanto sua alma destrutiva e nossa religiosidade surge convenientemente para respaldar nossa postura doentia. Será que todas estas mazelas não surgem por conta da incapacidade humana de se perceber? Talvez seja a ausência desta percepção do "I" que torna o ser humano tão destrutivo.

Dentro desta perspectiva o pronome/unidade "I" passa a ecoar como um convite para que o ser humano se identifique, se reconheça, e possa se dar conta de quem realmente é.

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