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sexta-feira, 28 de dezembro de 2018

Ganga Zumba, Jesus, e o Verdadeiro Herói da Celebração da Consciência Negra

Queriam um herói para representar a luta dos negros contra a escravização europeia e entre tantos grandes nomes escolheram um que nunca foi herói, erraram feio! O erro na verdade denuncia um problema mais complexo que tem a ver com a incapacidade humana em reconhecer o altruísmo de quem pensa no coletivo, em geral, nestes tempos tão egocêntricos, cultuamos quem pensa apenas em si mesmo, mas estes nunca serão, nem nunca foram heróis

20 de Novembro é celebrado em vários municípios brasileiros, o dia da consciência Negra, e como as duas principais cidades do país comemoram a data, o feriado municipal se torna numa celebração nacional. Esta data evoca a morte de Zumbi dos Palmares, líder do Quilombo dos Palmares, situado onde hoje é o Estado de Alagoas, mas muito se fala sobre o fato de que o personagem Zumbi não era uma boa pessoa, e que ele nunca foi alguém que realmente representasse a luta pela igualdade racial; na cidade do Rio de Janeiro inclusive, foi inaugurada um monumento dedicado a este personagem e não obstante periodicamente a estátua de Zumbi aparece vandalizada, por vezes nestas vandalizações, encontramos insultos raciais, mas algumas vezes as pichações denunciam que Zumbi nunca foi de fato um herói dos negros.

E a maioria do povo não entende o que de fato ocorre em torno desta polêmica, isto porque o Brasil infelizmente não conhece sua história, e este desconhecimento favorece o fato de que a celebração da consciência negra celebre o herói errado.

A primeira coisa a fazer então é conhecer um pouco mais da história do Quilombo dos Palmares, obviamente um simples post num blog não é suficiente para narrar todos os acontecimentos, mas ainda que resumidas, as informações podem nos ajudar a entender melhor os acontecimentos.

O Quilombo nasceu numa época mais remota, alguns documentos afirmam que desde 1580 já existiam escravos foragidos vivendo naquele local, mas o lugar realmente ganhou força a partir de um homem chamado Ganga Zumba, (ou Ganazuma) que traduzido significaria grande líder, ou grande senhor, Ganga Zumba era filho da princesa Alquitune no Kongo, nascido em 1630 foi capturado por conta de disputas no Kongo, e foi vendido como  escravo para os portugueses, acabou numa fazenda na Capitania de Pernanbuco.

Resultado de imagem para Ganga ZumbaPor volta de 1669 e 1670 Ganga Zumba organizou uma fuga em massa de escravos de várias fazendas nas Capitanias de Pernanbuco e de Alagoas, na fuga eles foram para o Quilombo que como dissemos, já existia desde muitos anos antes, na fuga Ganga Zumba levou consigo seu sobrinho o nome do sobrinho era Zumbi. Zumbi na época era um jovem de 15 anos e apensar de também ter sangue real, já havia nascido em terras brasileiras como escravo.

Ao chegar no Quilombo, Ganga Zumba foi reconhecido como descendente dos reis no Kongo, e naturalmente tornou-se um líder, um verdadeiro rei naquele Quilombo. Palmares chegou a ter 6 mil habitantes, para se ter uma ideia, a cidade do Rio de Janeiro tinha na época uma população menor que esta, e Ganga Zumba era o grande rei naquele lugar, e naquele reino de Palmares Zumbi era respeitado como parte da família real.

Por anos os Portugueses lutaram contra o Quilombo, em diversas incursões eles tentaram acabar com aquele pequeno reino dentro das terras brasileiras, mas perderam; os portugueses foram derrotados em todas as suas tentativas. Em 1677 Fernão Carrilho, que era administrador do Brasil designado pela coroa portuguesa, atacou o Quilombo, novamente não teve sucesso, mas neste ataque ele conseguiu capturar cerca de 40 pessoas, entre eles o filho de Ganga Zumba.

No ano seguinte a coroa de Portugal desistiu de tentar enfrentar o Quilombo, temos que lembrar que anos antes eles haviam lutado arduamente para expulsar os holandeses que haviam invadido Recife e Olinda, e tomaram partes de Pernambuco e da Paraíba, e isto em parte explicava a falta de condições da coroa portuguesa em desarticular o Quilombo dos Palmares. O governador de Pernambuco na época, um homem chamado Pedro Almeida, propôs um acordo com Ganga Zumba, por este acordo o Quilombo acabaria, e todos os negros ganhariam a liberdade, eles teriam que deixar a região dos Palmares e viveriam em liberdade na região do Vale do Cucaú, na reunião com o governador estavam Ganga Zumba e Ganga Zona seu irmão, e por fim eles decidiram aceitar o acordo, Ganga Zona chegou a se mudar para o vale do Cucaú, mas ao perceber as articulações para o desmonte do Quilombo, Zumbi se revoltou, ele não queria que aquele pequeno reino de dissolvesse, afinal naquele lugar Zumbi era um líder com sangue real, por fim ele envenenou o tio matando Ganga Zumba e assumindo assim a liderança do Quilombo.

Resultado de imagem para domingos jorge velhoSobre a liderança de Zumbi o acordo com Portugal foi desfeito e as lutas contra a coroa portuguesa voltaram. Em 1695 a coroa portuguesa convocou o bandeirante Domingos Jorge Velho para lutar contra Palmares, Jorge Velho foi um importante Bandeirante que avançou Brasil a dentro na conquista de nosso território, mas ele era um homem bastante cruel, e era famoso por ter matado muitos índios. Mas o Quilombo não caiu apenas por que Jorge Velho era um grande combatente, na verdade Zumbi foi traído e vários moradores do Quilombo se voltaram contra ele e ajudaram Jorge Velho a matar Zumbi.

Zumbi e muitos quilombolas foram mortos em 20 de Novembro de 1695 e o Quilombo dos Palmares acabou, alguns que haviam cooperado com a coroa na morte de Zumbi ganharam a liberdade, e os que haviam ido para o Vale do Cucaú com o antigo acordo tiveram o acordo mantido e também viveram em liberdade.

Em toda esta história (muito resumida), o que fica evidente é que o verdadeiro herói da luta pela liberdade dos negros foi Ganga Zumba, ele aceitou abrir mão de seu reinado em Palmares para que todos tivessem a liberdade. Sobre Zumbi, depois se soube que no período de 18 anos em que governou Palmares ele foi extremamente cruel, escravizava negros de quem não gostava e os vendia de volta para as fazendas, e foi um déspota, e por isto foi traído por seus iguais.

Mas porque houve este absurdo de se ver Zumbi como herói? Um sujeito que matou o próprio tio que o havia salvado da escravidão e depois se revelou um governante cruel, como ele pode ter se tornado um herói?

Quem divinizou Zumbi foi o educador sociólogo Darci Ribeiro, e justiça seja feita, ele foi um grande educador, mas ele idealizou um Zumbi diferente do que realmente aconteceu, na narrativa de Darci Ribeiro, Zumbi foi visto como alguém que não aceitava o domínio imperialista português e isto fez dele um verdadeiro revolucionário. Infelizmente Darci estava absolutamente equivocado, e acabou fazendo aquilo que George Orwell profetizou em seu livro 1984, quando descreveu um personagem cuja a função era pegar criminosos e gerar sobre eles noticias falsas para criar heróis, heróis falsos, mas que atendiam as demandas de uma sociedade que vivia sobre um domínio fascista. Darci criou um falso herói, tendo tantos verdadeiros ao redor, lamentável!

Ganga Zumba este sim foi um grande herói, um rei disposto a abrir mão de sua coroa para que seu povo pudesse viver em liberdade e em paz, ao invés dele, o povo cultua um homem sanguinário, cruel, homicida e traidor.

Isto me faz lembrar de Jesus, porque isto de vermos o povo cultuando o violento não é de hoje, na época do Cristo o povo tinha um homem altruísta mas escolheu o herói violento e narcisista chamado Barrabás, condenando Jesus a morte.

Frequentemente somos colocados em situações onde temos de escolher, entre o benefício pessoal ou o benefício coletivo. A sociedade nos ensina que os heróis pensam sempre em si mesmos, Zumbi preferiu manter seu posto de líder, matando o próprio tio. A sociedade cultua personagens assim e nos ensina pensarmos apenas em nós mesmos, mas Jesus disse que devemos amar o próximo como a nós mesmo, então o herói foi Ganga Zumba que preferiu sacrificar sua condição real para benefício coletivo, ninguém pode ser considerado herói quando luta apenas por seus próprios interesses.


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